quinta-feira, 30 de agosto de 2007

o aumento de frouxidão e a inflação do prestígio das vias: um estudo comparativo

If the routes stayed the same, but the gradings were suddenly all switched around, it would be interesting to see which routes people would be trying.

Jim Holloway

Cá está. Não é só o LA que sabe fazer citações. Eu também sei. E esta é muito boa. Por acaso gamei esta dele. As citações demonstram que um gajo é inteligente. Que tem cultura geral. Para quem não sabe, a cultura geral mede-se pela quantidade de citações que um tipo diz por dia.
O problema é que, normalmente, quando se usa uma citação, é suposto o texto não ter nada a ver com a dita. O propósito da mesma é o de ganhar uma discussão, ou seja, arrumar com o outro gajo, qu’ele até fica a pensar “ena pá, com essa é que me lixaste”. E se a citação nada tiver a ver com o assunto em causa, melhor ainda, que é da maneira que o deixamos ainda mais confuso. Por exemplo, esta foi gamada de um texto sobre aves. Já na altura não percebi o que tinha a ver. Se calhar as aves só vão a uma via por causa do grau. Será que as aves mais fortes só nidificam em oitavos?

Acontece que a citação em causa até tem a ver com este post, mais concretamente com o prestígio. Às vezes, parece que as vias têm dois graus: um de dificuldade e outro de prestígio. Curiosamente, o de prestígio é sempre igual ou superior ao de dificuldade. Nunca é inferior. A não ser que a via seja de placa. Não há nada mais baixo que o grau de prestígio de uma placa. Melhor dizendo, não existe nada que arruíne mais a reputação de um indivíduo que fazer uma via de placa. Quer encadeie um 8a de placa, quer caia num 6a de placa. Que, no fundo, acaba por ser o mesmo.

O grau de prestígio é tão importante que chega a afectar a própria qualidade da via. Se esta for um 7a, assim pró fácil, a via é um espectáculo, fácil de sacar, só presa grande. Se alguém decide gritar “o rei vai nú” e decota a via, esta passa de imediato para um 6c+ merdoso, passo mitrado sem jeito nenhum. Por isso é que as vias lá fora são boas. O grau de prestígio é enorme e o encadeamento à vista chove como cães e gatos. Tudo a experimentar aquela via dura mas boa, só porque no croqui vem um número porreiro:

- Ouve lá, é mesmo 7a?
- Sim, é 7a, presa grande, pouco inclinada, fácil de sacar à vista, é boa para ti.
- Mas é 7a?
- Sim, é.
- Mais duro que um 6c+?
- Eh pá, isso já não sei, se calhar não. Fiz à segunda. E nunca fiz sequer 6c+ à segunda. Aliás, acho que nunca fiz 6c+... Mas diz neste croqui com pelo menos 20 anos que é 7a, e o croqui não falha.
- Ah, bom, então vou lá!!

Ora eu acho que devia ser justamente o contrário. Tipo,

- Lá vai o fulano de tal, aquele gajo que fez agora um oitavo.
- A sério? Não dava nada por ele. Alguém o viu a fazer o oitavo?
- Vi-o eu a sacar aquele 6b manhoso à vista.
- Fosga-se, é mesmo forte!! Respect!!

Acrescento que acho até extraordinário como a malta se orienta tão bem a chamar as vias pelo grau (normalmente o de prestígio, claro). O nome, obviamente, é um mero acessório. Inclusivamente, até parece que houve aí uma polémica com um gajo que partiu umas pedras coladas na base das vias, com o nome das mesmas. Devo dizer que sou contra as pedras com nome na base das vias. Para quê o nome? Assim as pedras não dispensam o croqui! Quem lê o nome da via na sua base fica sem saber o mais importante, que é, obviamente, o grau. Por isso, acho que se deveria pôr apenas o grau na base das vias. Ocupa muito menos espaço, logo o impacto visual é menor. Para que interessa o nome? Se se falar no nome de uma via, ninguém sabe onde fica. Já pelo grau, toda a gente vai lá. E se for a puxar para cima, então é uma verdade absoluta e intocável. Mesmo que se faça a via com pegue e meio, apesar de nunca se ter feito aquele grau na vida. Mas se a via só sair ao vigésimo, a coisa pia mais fino, “qu’eu já fiz este grau à vista”. Não pode ser. Esqueçamo-nos que isto é uma rocha nova, um estilo novo, uma técnica nova, uma via nova (i.e. sem pinta de magnésio) e subamos o grau, “qu’eu não tou aqui para me rebentar em 6b’s”. Ou então, cagamos d’alto na via e vamos para aquele 7a vertical com presa à mão cheia de meio em meio metro.

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